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Nota Prévia :

Este Blog destina-se exclusivamente à divulgação de trabalhos escritos por mim para meu prazer e daqueles que eventualmente estivessem interessados na sua leitura.

Felizmente, foram muitos os que se me dirigiram a pedir que divulgasse alguns dos meus trabalhos, especialmente os que mais me marcaram ao longo da minha vida, daí ter feito uma escolha selectiva de entre todos eles, muitos ficando de fora, naturalmente .

Foi por esse motivo que surgiu este Blog .

Muitos desses trabalhos já haviam sido publicados em periódicos e revistas da especialidade e não só, muitos deles além fronteiras ( EUA e BRASIL ), e alguns chegaram mesmo a ser galardoados em Concursos de Contos e Poesias e diversos Jogos Florais .

À medida em que forem inseridos neste Blog, tentarei informar quais os já anteriormente publicados, onde e quando e se tiverem sido galardoados, quais os prémios que lhes foram atribuidos e quais as Organizações envolvidas .

Espero que a memória não me falhe e os meus apontamentos não estejam incompletos.

Ericeira, 20 de Janeiro de 2011

Carlos Jorge Ivo da Silva

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

O OURICEIRA


Eram quatro horas de uma manhã fria, apesar de estarmos em Setembro .
Tocou o despertador sobre a mesa de cabeceira, enquanto pela janela semi-cerrada do meu quarto entrava uma réstia de luz proveniente do candeeiro pendurado na parede exterior da minha casa .
Lá fora, o Largo de Santa Marta estava sossegado como de costume, digníssimo representante de toda uma Vila quieta e simples como é a possivelmente de origem fenícia Vila da Ericeira .
Levantei-me calmamente, pois me sobejava o tempo. Arranjei--me e fui à cozinha ver se ainda havia pão, que restasse do dia anterior e que ainda não tivesse sido transformado nas duas sandes, que eu utilizaria à hora do lanche, lá no mar alto. Por sorte ainda restava uma " bola ", à qual um pouco de queijo saloio veio dar um gostinho, que só e sempre na minha região consegui encontrar. Um copo de leite frio completou o meu pequeno repasto .
Na véspera, já havia verificado o meu material de pesca e tinha preparado a garrafa embotijada com linha de sapateiro à boa maneira da marinhagem, de forma a que me não faltasse a água, única bebida que utilizo com prazer sempre que o mar me chama .
Pus o boné na cabeça, apertei o fecho do meu blusão de borracha, peguei na alcofa de material e num dos largos bolsos do dito blusão meti o saquito de plástico com as duas sandes e dois maços de tabaco. Sempre ouvi dizer : " Quem vai ao mar, avia-se em terra " .
Desci a escada a passos leves para não acordar o restante pessoal e de mansinho saí porta fora, Largo de Santa Marta acima pela Rua Alves Crespo. Um vento fresco mas fraco corria-me a face. Tive um certo receio que houvesse nevoeiro, mas não .
Em tempo de lua nova, o céu ainda estrelado era belo de se ver, e a capela de Santa Marta, edificada em 1761 em substituição de uma outra, que estaria situada mais a sudoeste, dedicada a Santa Maria e destruída pelo tempo, aí me ficou pela esquerda, ladeada por peque-nos canteiros bem tratados e bem próxima do Parque do mesmo nome, onde em tempos havia uma Fonte de águas milagrosas, hoje fechada, porque impróprias para consumo, mas que eram procuradas por muita gente, nelas encontrando cura para os seus males de fígado, reumatismo, estômago e pele .
Subi a rua a passo lento como sempre o faço e num abrir e fechar de olhos cheguei junto ao paredão de cimento do Largo das Ribas, sobranceiro à praia do Peixe ( dos Pescadores ou da Ribeira ) .
Lá em baixo o mar estava calmo e nas rochas para os lados da Ponte de Coimando as costumeiras brancas em tempo invernoso não eram visíveis e a água espraiava-se de mansinho sobre a areia .
Um certo e natural sossego apoderou-se de mim. Primeiro, porque não teria problemas de maior com a navegação e segundo porque os meus companheiros não se negariam a ir, o que era o meu maior consolo dado o prazer imenso que sinto sempre que vou pescar .
Num ápice, aí estava eu junto ao pequeno farol em frente à Delegação Marítima, local combinado para o encontro com um dos companheiros. Eram exactamente cinco horas da manhã. A primeira obrigação do dia estava cumprida e a Vila da Ericeira, adormecida, começava a despertar .
O primeiro dos parceiros que vi, foi o Carcanholas, o Mestre da embarcação, homem de poucas palavras, mas sempre com um sorriso nos lábios ou uma frase estimulante nas horas tristes ou nostálgicas, que me comunicou a necessidade de ir à praça buscar sardinha para isco --- e talvez para almoço, se fosse mau dia de pesca como algumas vezes sucede ---. Só pelas seis e meia estaria aberta, o que nos daria tempo mais que suficiente para prepararmos a palamenta .
Em direcção ao norte, rodeámos todo o paredão e chegámos à casinha do Xico, onde já se ouvia barulho no seu interior. É dele que os pescadores se socorrem para adquirir tudo o que precisam levar para o mar, especialmente comida e bebida, e até uns rebuçaditos em forma de limão, e que conseguem por vezes substituir um cigarro. Decerto, estaria a preparar alguns garrafões de vinho, os quais não levam na maioria dos casos mais do que um litro, a ser distribuído por todo o pessoal da lancha a que se destinava, em número de três ou quatro elementos, ou sandes com chouriço ou queijo, que os pescadores tanto apreciam, a juntar à fruta que sempre levam quando saem para o mar .
Descendo a calçada, passámos pela Fonte da Lua e pela casa da lota até chegarmos à praia do Peixe, hoje substancialmente alterada pelo inevitável progresso e pela indomável vontade dos homens .
Já os barcos não vêm encalhar na areia nem são puxados pela junta de bois de antigamente, e o seu porte é cada vez maior, o que permite, devido a melhores condições, dar mais segurança a quem pesca. Os bois foram substituídos por dois tractores com guinchos, o que facilita grandemente as coisas, apesar de, por vezes, criarem os seus sarilhos, porque são máquinas, e a água salgada também os encharca . . . Os tratoristas que o digam . . .
A fisionomia da praia alterou-se quase por completo e o molhe, apesar de já oferecer alguma segurança aos pescadores, ainda não consegue dar resposta às mais prementes necessidades daqueles, que diariamente põem em risco as suas vidas para que o cidadão comum tenha à sua mesa o tão apetecido peixe fresco da costa da Ericeira ou o seu marisco .
Entre as rochas situadas a norte da praia e a muralha, que sustém a calçada, existe agora um patamar em cimento onde as pitorescas e majestosas embarcações de suaves cores repousam da sua faina, e pequenas casinhotas encafuadas na parede com portas fechadas a cadeado servem para guardar as artes de malhas várias e outros utensílios, aos pescadores .
No alto dessa muralha a cor clara do Forte, construído em 1670 e actualmente utilizado pela Guarda Fiscal, é farol suficiente para quem demanda as costas da Ericeira e se sente confuso no meio do mar, por não conhecer bem a costa .
Ao chegarmos à lancha, aí estava já o Ti Abílio a ver se o gasóleo era ou não suficiente, pois em caso de necessidade poderíamos ter que dar duas ou três poitadas até encontrarmos um bom local de pesca .
Os cabos e o ferro lá estavam na proa, preparadinhos para deitar ao fundo, quando fosse necessário, tal como a pedra colocada no cabo a quatro ou cinco braças do ferro, para o obrigar quando no fundo a permanecer na posição horizontal. O prumo com a sonda também lá estava na ré no seu canto costumeiro .
Baldes, caixas, alcovas, saquitos, canas com carretos e restante material, tudo foi arrumado para não " empachar " o pessoal .
Coube-me a incumbência de ir buscar o isco, e com o balde aí fui eu calçada acima até ao mercado, passando pela belíssima Capela de Santo António, construída nos meados do século XVII, também conhecida por Capela de Nossa Senhora da Boa Viagem, por quem os pescadores da Ericeira, e não só, têm uma profunda devoção, e pela Igreja da Misericórdia, com o seu teto em madeira pintada por Manuel António Gois e Sebastião de Carvalho, fundada nos finais do século XVII por Francisco Lopes Franco, uma das mais curiosas de todo o Concelho, com o seu magnifico Museu e a sua bem apetrechada biblioteca, deixando à esquerda o Pelourinho manuelino do século XVI, que faz inveja aos da maioria das vilas do nosso país .
Por diversas e típicas vielas lá cheguei ao mercado onde uma " camioneta " descarregava algumas caixas de sardinha e as varinas e peixeiros labutavam na descarga das caixas .
Doze mãos de sardinha, que completariam mais ou menos três quilos, quantidade normal e suficiente para três pessoas, durante um dia de pesca à linha, foram introduzidas no balde. O pagamento ficava a cargo do mestre da lancha e eu fazia parte da tripulação como simples pescador e, ainda para mais, aprendiz de fresca data .
Lá regressei ao barco e à companha e propusemo-nos a seguir o nosso rumo. Retirámos os calces feitos de tacos de madeira, que mantinham a lancha direita e, depois de inclinada, chamámos o tratorista para nos levar o barco até à rampa junto ao molhe e nos empurrar para o lago .
Após alguns metros de reboque e empurrão final, ficámos a boiar sob um sossego maravilhoso. Enquanto o Ti Abílio punha a embarcação em marcha, coloquei a cana do leme no sitio e agarrado a ela pedi instruções ao mestre, que me ordenou seguíssemos o rumo de noroeste, como sempre fazia. Mas sempre se pergunta, não vá o Mestre ter outras ideias e não vamos nós na próxima pescaria ficar de fora .
Saímos do porto ainda a aurora se não fazia sentir e como por encanto deixámos para trás a praia do Norte ou do Alcobio .
Após meia hora de navegação os raios violetas e vermelhos do astro-rei surgiram a nascente, enquanto a poente o planeta Vénus Ía tendo o seu ocaso, no meio de uma leve bruma, que o pouco vento Ía levantando e desapareceria totalmente com a total visualização do sol, pelo aumento da temperatura do ar .
A costa da Ericeira ía ficando para trás, espantosamente bela como se fosse um óleo setecentista de Rembrandt, onde os contrastes de luz não se conseguem aperceber apesar da nitidez das suas virtuosidades .
O matiz do amuralhado barrento de S. Sebastião contrastava com a sua pequena capela. branquinha na sua planura, deixando para sul o aconchego de casas, que compõem a Vila da Ericeira, e a pouco e pouco se vão dissociando e se tornando especificas e coloridas com o alvor da madrugada .
Entretanto, lá íamos escamando a sardinha e colocando-a noutro balde em camadas separadas pelo sal que o Ti Abílio não se tinha esquecido de trazer .
Quando acabámos de preparar o isco foi a vez de prepararmos as pescas e cortarmos algumas sardinhas em pequenos filetes, que iriam ser repasto de alguns peixes e doutros a sua traição. Pequenos madeiros serviam-nos para esse trabalho. O Carcanholas trouxera umas ferradas de polvo e uns lingueirões, que iriam ser utilizadas mais pela manhã fora .
Poderia muito bem ser que algum " trombadinhas " ou " vermelhinho " ( gíria de pargo ) viesse encantar-se num dos anzóis e não o quisesse largar mais. O " caramoeiro " ( camaroeiro ) lá estava à vertical espetado num buraco feito numa amura, à espera de ser convidado para tal esponsório .
A hora e meia de viagem chegámos ao " Mar do Ti Abílio ", homem de rija tempera e de vastos conhecimentos piscatórios e náuticos, a quem devo hoje muitos dos meus conhecimentos, reconheço-o .
Aí largamos o ferro ( ou a poita ) e atrás dele muitas braças de cabo. Mais dez ou quinze braças largadas depois do ferro tocar o fundo e esperámos que algum cabeço fizesse parar a lancha, o que aconteceu alguns segundos depois, fazendo-a aproar ao norte .
A água corria a sul e lá lançámos as pescas à procura de quem não prometeu. Momentos escassos eram passados e eis que senti o primeiro toque. Levantada a pesca surgiu o primeiro chumbado do dia. Não havia dúvida de que estávamos sobre pedra e fiz votos para que a pescaria fosse boa. Aqueles homens eram profissionais e mereciam-no. Eu era e sou um simples amador e não estava nem nunca estive à espera do que se pescasse para viver, mas aquela era e é a sua profissão, e quanto mais eu apanhasse, mais lhes facilitaria a vida. E isso sabiam eles perfeitamente, como bastas vezes m'o demonstraram .
Ruçadas e fanecas seguiram-se rapidamente em rodopio, até sentir um fortíssimo esticão. Julguei que era uma tintureira, uma espécie de pequeno tubarão azul, tão frequente nas costas da Ericeira, e que nos vem com certa facilidade ao cheiro do óleo, que a sardinha deixa na água, e o sente a mais de 200 metros de distância .
Alertei o pessoal e disseram-me que não era muito natural, pois as tintureiras costumam navegar a meia água e eu estava a pescar ao fundo, mas tudo podia acontecer. O peso mantinha-se grande e os toques eram fortíssimos e contínuos e eu estava a pescar com um anzol " de rebeira " empatado em estralho de aço. Se fosse, não se " pisgava ", quase de certeza, mas existe sempre o quase, que nunca é certo. A umas duas braças de fundo vi um vulto grande com cerca de sessenta ou setenta centímetros e o Ti Abílio disse-me para lhe passar a cana, o que fiz e agradeci por ele ter muito mais prática do que eu --- se àquilo que eu tinha se chamava prática --- nessas andanças. Era mesmo uma tintureira e ele sacou-a para dentro logo de seguida. Uma " naifada " na cabeça acabou com os movimentos do predador e a caixa do peixe lá ficou com mais um para a colecção .
É costume nestas alturas chamarem-se uns nomes feios a estes bichos, mas os meus companheiros de fortuna foram bastante comedidos nas suas nomenclaturas, talvez porque não tivesse havido tempo para que a tintureira embaraçasse as pescas, como o faz normalmente .
E assim estivemos a pescar até cerca do meio dia, hora em que o Ti Abílio pôs algumas fanecas amanhadas e uns carapaus com sal dentro de um balde à espera de melhor destino e acendeu o fogareiro a carvão, virando a boca para noroeste, para que o vento auxiliasse a atiçar o lume .
Cerca de dez minutos depois, e ao mesmo tempo que pescávamos, começámos o nosso petisco. O pão era saloio e fora o nosso Mestre Carcanholas, que o tinha ido buscar antes de se encontrar comigo junto ao farol .
De vez em quando lá Ía mais um peixito a espadanar para dentro da caixa ou lá me picava eu num anzol, por falta de treino ou atenção .
É bom dizer-se, que o peixe assado na brasa, naquelas condições tem um sabor divinal, o que infelizmente em terra não é possível notar-se. Os restos deitam-se ao mar, para servir de pasto às pequenas aves marinhas, que sempre nos fazem companhia enquanto estamos a pescar, ou às viajantes e airosas gaivotas, esbeltas no seu voar, que por vezes pairam perto das embarcações como se fossem patos baloiçando ao sabor das meigas e calmas ondas .
Acabado o almoço, lá se conseguiu apanhar dois " vermelhinhos " e muitas choupas e ruçadas, além de uns carapaus e de uma dourada, mas eu não estava satisfeito, pois o peixe que mais gosto ainda não tinha vindo a nenhuma das linhas. Esperava pescar pelo menos uma cavala ou uma sarda e não havia meio. Há quem goste mais de cavala por ser menos reimosa --- diz-se na Ericeira “ raimosa “ ---, mas o meu paladar vai com a maioria dos pescadores preferindo a sarda frescal escalada pelas costas e cozida com batatas .
É certo que há um petisco na Ericeira que, hoje em dia, só muito raramente se consegue comer, mas é sensacional, lá isso é . . . a celebérrima " Caneja de infundice “. Quem apanha uma caneja chama-lhe sua e os outros só a comem se forem convidados para a festa . . . Tal é o petisco .
Lá consegui, então, apanhar uma cavala e duas sardas para meu contentamento .
Pelas quatro da tarde toca a levantar o ferro e a voltar a penates, pois começava a sentir-se uma leve aragem da " Nortada " e pequeníssimos cachões desfaziam-se de encontro à proa da lancha, cortados pela sua roda .
Levantadas as pescas e arrumado o convés, motor em marcha, levantado o ferro e enrolado o cabo, cana do leme no sitio, lá começamos o regresso ao porto. À medida em que nos vínhamos aproximando da Ericeira, o espectáculo visual era cada vez mais digno de ser admirado. Quão maravilhoso presépio, que se espencava perante os nossos olhos, e a ponta do molhe era o ponto de referência no rumo da embarcação .
A norte da Vila, o campanário da Igreja Matriz ou de S. Pedro, construída no século XVIII, com o seu magnifico altar-mor em talha dourada de autoria de Matias José de Faria e terminado em 1745, espoliada de todas as suas riquezas por ordem dos franceses em 10 de Março de 1808 e fronteada por um soberbo Cruzeiro, lá surgia alegremente entre o emaranhado de casinhas brancas divididas por pequenas e típicas vielas .
Mais ao longe, para lá da ponta oeste do Hotel de Turismo sobranceiro às Furnas, ainda se via as praias do Sul e da Foz do Lizandro, tendo como pano de fundo a soberba e verdejante Serra de Sintra, dela sobressaindo os contornos da Pena e do Castelo, que são também pontos de referência para a marinhagem .
Chegámos ao porto pelas seis menos um quarto da tarde, tendo a embarcação sido colocada no lugar habitual sobre calces e aberta a " jaja " ( ou ralo ) para sair a água, que se acumula no fundo do barco junto ao cavername durante um dia de pesca, o que é normalíssimo .
Dividida uma parte do pescado menor, a " caldeirada ", pelos três mais uma quarta parte para o barco, pelo sistema dos montinhos, --- em que um dos pescadores está de costas viradas para o pescado, enquanto um dos outros pergunta a esse a quem vai caber cada um dos montes --- guardada a sua parte do pescado, que lhe foi atribuída por sorte, levou-se o restante para a casa da lota, para ser vendido em leilão .
Até isso já não é como dantes. O pescado era vendido ao público colocado sobre a areia da praia em pequenos montinhos e que dava prazer a quem assistia. Qualquer pessoa podia comprar peixe fresquinho e a quantidade que lhe aprouvesse .
Hoje nem isso se pode fazer, pois para se entrar no recinto da lota e arrematar algum pescado é necessário ter um cartão especial de comerciante de peixe. Caso contrário, nada há a fazer senão ir comprar o peixe no mercado .
Dizia o Senador romano Cícero num dos seus discursos no Senado : " O TEMPORA, O MORES " ( Noutros tempos os costumes eram outros ) .
Entregue o peixe na lota, fomos à lojinha do Xico tomar uma bebida para nos refrescarmos, pois cá fora de água o calor fazia-se sentir intensamente contrastando com a madrugada fria que tivemos, e cada um de nós com a sua " teca " seguiu em direcção a casa .
No poente o sol começava a pôr-se e o caminho que me trouxe, o mesmo me levou, enquanto pelo meio se ouvia o chilreio dos pássaros, que se acoitavam nas ramagens das árvores do Jogo da Bola e se via os voos rasantes das andorinhas em alegres piares e destemidas acrobacias em véspera de despedida .
Os veraneantes passavam calmamente saboreando os restos de sol daquele dia calidamente temperado e por mim passavam olhando o saco de plástico com o peixe que me coubera em sorte e a minha vestimenta desusada para aquela época .
Lá para os lados das Furnas, o mar azul deixava a certeza de, no dia seguinte, poder ser navegado por tantas outras embarcações como aquela em que fui pescar com dois excelentes homens da Ericeira, o Carcanholas e o Ti Abílio, e se chamava " Ouriceira " .

Ericeira, Agosto de 1988

( Apresentado a concurso aos 1º.s Jogos Florais da Ericeira em 1989 promovidos pela Liga dos Amigos da Ericeira, sob pseudónimo " O Saloio ", tendo sido premiado em Agosto do mesmo ano com o primeiro prémio, tendo também sido publicado em três partes no Boletim Informativo “ ECO “, daquela Organização --- Nº. 1 - 1ª. série de Out / Nov de 1989, Nº. 2 de Jan / Fev de 1990 e nº. 3 de Mar / Abr de 1990 )

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