Pequena Nota Explicativa :
O documento que se segue deverá ser distribuído pelos trabalhadores TAP, aquando da realização de uma vigília no corredor fronteiro ao Departamento de Finanças e Vencimentos.
Os trabalhadores que quiserem aderir deverão vestir " jeans " e calçar sapatilhas, levando consigo uma pequena malga vazia e algumas sandes, utilizando dois tipos de pão diferentes .
Não deverá ser feita algazarra, mas antes pelo contrário, os trabalhadores envolvidos nesta vigília deverão manter-se sentados no chão e em silêncio .
Somente um trabalhador deverá estar levantado a fim de poder dar indicações a quem as solicitar ao mesmo tempo que deverá distribuir este manifesto .
Caso haja proibição desta manifestação pacifica, os trabalhadores deverão reunir-se no exterior da área TAP, na relva fronteira à Custódia, a norte do portão da ANA / EP, mas sempre em silêncio .
MANIFESTO AOS DESPREVENIDOS
Concidadãos
Nós não estamos em greve nenhuma .
Manifestar não é propriamente fazer festas com as mãos, mas sim assumir posições, que podem ser consideradas aborrecidas, ingratas, intolerantes ou insubmissas, mesmo sem o beneplácito régio ou qualquer outra régia dissertação acerca de flores .
Quando alguém se manifesta é porque existe, pois caso contrário nunca o poderia fazer, desde que já tivesse batido a bota .
O principio fundamental de um manifestante é sempre a esperança que ele tem, que alguém ligue ao que ele diz ou ao que ele faz, mesmo que a acção ou a palavra signifiquem no final, que não valeu a pena socorrer-se de tal estratagema --- não queremos dizer com isto, que tenhamos atirado fora a clara e a galaza para ficarmos só com a amarelinha --- .
Resolvemos sentarmo-nos quietinhos, sem maçar ninguém nem amassar o que ou quem quer que seja, numa atitude de sossego e reflexão enquanto esperamos .
Temos todos uma única razão, que nos levou a ponderar esta nossa actuação posicional, que é esperar pelo nosso mui querido ordenado .
Sabemos que estamos a meio do mês, mas o que querem ?
Somos assim .
Temos consciência de que sem dinheiro ninguém vive. É um hábito chato, mas . . . Paciência . . . força das vicissitudes humanas de nada fazerem sem que tenham uma retribuição .
Não estamos contra a Entidade Patronal. Isso é que não ! ! ! .
Não ! ! ! Não ! ! !
Por quem sois, caríssimos concidadãos. Longe disso.
Nada de más interpretações ou desgastantes quebras cabeças numa atitude tão simples como a nossa. A Companhia não nos deve um tostão. Nós trabalhamos e ela paga-nos no dia que nos marcou para recebermos. O que não temos culpa, é do dinheiro não chegar nem para as primeiras necessidades nem sequer para as mínimas necessidades fisiológicas, ou seja, nem para limpar o . . .
Claro que a culpa não é da Companhia, como já o afirmámos. Não imputamos culpas a ninguém. O que precisamos é de dinheiro que nos dê forças para viver. Até lá, vamos esperando aqui até que chegue o fim do mês .
Mas . . . e os outros ? Perguntais vós com toda a razão . . . e nós dizemos muito simplesmente, que se venham sentar aqui ao nosso lado e esperem também até ao fim do mês, de forma a manifestarem a sua solidariedade com eles mesmos .
E se alguém perguntar o que fazemos, nós dizemos, que estamos esperando que se sentem junto a nós, na mesma atitude de esperança e reflexão .
Como vêem, é simples. Não tem nada de especial estarmos aqui sentados, e quem pensar o contrário e não estiver de acordo em se sentar ao nosso lado, é porque não tem o poder de encache, que nós temos e o ordenado lhe chega. Isso permitir-nos-á concluir, que afinal somos nós que estamos errados, e neste país ainda há quem tenha possibilidades de criar no banco contas de poupança e [ ou ] a prazo, que mais dia menos dia deixarão de existir, porque são a um prazo muito limitado, naturalmente .
Cá os esperamos, caríssimos concidadãos, quanto mais não seja para um " tète-à-tète " numa malguinha de sopa ou numa sandes de pãozinho mais ou menos branco com pãozinho de segunda .
Estão todos convidados e mesmo os que agora não aceitarem o nosso convite amável e terno, dentro em breve teremos o grato prazer da vossa companhia, quer queiram quer não, pois sereis vós próprios a convidar-nos .
Bem hajam pela vossa atenção
OS RESIGNADISSIMOS
Lisboa, Carnaval de 1991
( Este texto foi preparado para ser distribuído durante as festas de Carnaval na TAP em 1991, embora nunca tenha efectivamente sido distribuído por razões que se prenderam com uma certa desmobilização do pessoal envolvido. Havia, é certo, muita gente que se encontrava interessada em que o assunto fosse passado à prática. O vislumbre de um possível envolvimento político de várias organizações levou a que o projecto fosse posto de lado, pois tratava-se de uma chamada de atenção ou simplesmente de uma tentativa de alteração da opinião pública e não da possibilidade de dar de bandeja a organizações politicas, fossem elas quais fossem, o ensejo de se sobrejogarem com o seu respectivo aproveitamento político )
Sem comentários:
Enviar um comentário