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Nota Prévia :

Este Blog destina-se exclusivamente à divulgação de trabalhos escritos por mim para meu prazer e daqueles que eventualmente estivessem interessados na sua leitura.

Felizmente, foram muitos os que se me dirigiram a pedir que divulgasse alguns dos meus trabalhos, especialmente os que mais me marcaram ao longo da minha vida, daí ter feito uma escolha selectiva de entre todos eles, muitos ficando de fora, naturalmente .

Foi por esse motivo que surgiu este Blog .

Muitos desses trabalhos já haviam sido publicados em periódicos e revistas da especialidade e não só, muitos deles além fronteiras ( EUA e BRASIL ), e alguns chegaram mesmo a ser galardoados em Concursos de Contos e Poesias e diversos Jogos Florais .

À medida em que forem inseridos neste Blog, tentarei informar quais os já anteriormente publicados, onde e quando e se tiverem sido galardoados, quais os prémios que lhes foram atribuidos e quais as Organizações envolvidas .

Espero que a memória não me falhe e os meus apontamentos não estejam incompletos.

Ericeira, 20 de Janeiro de 2011

Carlos Jorge Ivo da Silva

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

TRIOLOGIA DO MAR E AS MEMÓRIAS DE UM CATADOR DE CONCHAS - I


EM BUSCA DAS CONCHAS PERDIDAS PELO MAR


Muitas têm sido as vezes que me desloco à beira-mar em procura de conchas para a minha colecção. Aproveito para me ginasticar, gozando as delícias que a beira-mar sempre me oferece. Cada vez que me baixo para apanhar uma concha é mais uma flexão contabilizada no grande rol das muitas efectuadas. Se para um lado da praia sigo os trilhos do quebra mar que separa a areia molhada da areia seca e onde os restos amiúde se juntam com as algas partidas e os pequenos ramos, que o mar atira inadvertidamente à praia, no sentido contrário venho na quebra das ondas a chapinhar e a fazer fisioterapia marinha, recebendo as ondinhas nas minhas pernas como um bálsamo natural e propício à possibilidade de novas caminhadas tão agradáveis como benfazejas para a minha saúde física e mental, enquanto penso .
Verifico muitas vezes que os banhistas não têm a mínima contemplação pelos restos das conchas e a seu belo prazer --- pelo menos parece --- vão caminhando propositadamente sobre os trilhos, embora tenham dezenas de metros de areal a estibordo e a bombordo completamente livres de conchas, partindo-as ou enterrando-as na areia inexoravelmente, pois os seus restos não servem para nada a não ser para aumentar o volume imenso de areia, que o mar traga e devolve quando muito bem lhe apetece .
Quando vejo um desses indivíduos à minha frente dá-me vontade de o mandar “ dar uma curva ao bilhar grande “, pois não há direito que me estrague o meu prazer. Mas … a praia é de todos os que nela se entretêm a desfrutar prazeres, senão os meus, outros quaisquer, mas não menos valorosos, decerto .
Por vezes, lá aparece alguém que me pergunta o que é que eu estou a fazer com um saquinho e uma caixinha de plástico na mão. De pessoa para pessoa depende a minha resposta. Se a uns digo que estou a apanhar conchas para a minha colecção e, dependendo do seu mostrado interesse, lhes explico exactamente o que estou a fazer, especialmente a miúdos, levando-os a ter interesse pelo coleccionismo de conchas e estes na sua paga natural apanham muitas e dão-mas perguntando amavelmente se me servem. Claro, mesmo que não sirvam, servem sempre para gáudio da pequenada que se sente útil no que está a fazer ajudando-me e amanhã alguém os ajudará também, estou certo. Aos outros, que me andaram a estragar os pontos de recolha, lhes digo que, como sou maluco ando a apanhar alguns grãos de areia para fazer um carreirinho lá em casa, mas com grãos muito especiais, que só existem naquela praia e é preciso escolhê-los bem … e eles lá se afastam pensativos e a dizer para os seus botões ou para as suas tea-shirts : “ … ou este gajo é maluco mesmo ou está a fazer de mim palhaço … “ . A segunda opção é a verdadeira, penso eu .
Por vezes, procuro conchas específicas como por exemplo os muito pequenos, multicolores e belíssimos “ Pectens “ e “ Chlamys “, de que as nossas praias são tão pródigas ou as pequenas “ Tellinas Tenuis “ ( cor de rosa )  ou as lindíssimas “ Tellinas Fragilis “ ( branquinhas como a cal das paredes ), que por serem tão raras tanto maior é o meu prazer em as apanhar, especialmente após as marés vivas. Nem sempre aparecem dependendo o seu aparecimento da época do ano em que as busco, diferindo também a sua existência de praia para praia, naturalmente. Raramente apanhamos conchas de habitat em areia em praias rochosas .
De tempos a tempos, lá aparece um “ Apohrrais Pespelecani “ ou uma pequeníssima e rosada “ Trivia Monacha “ ( que o povo conhece como “ Beijinho “ ) trazendo no dorso levemente rugoso e ondulado sempre três pintas escuras, que a diferenciam de outras Trivias. Que grandes achados … São raros nas nossas costas marítimas, embora os haja a três ou quatro metros de profundidade … mas o mar prefere guardá-los religiosa e sofregamente … e eu sem culpa nenhuma …
E as gaivotas ?! Aqueles animaizinhos de duas patas, que pedem licença a uma para mover a outra e só sabem correr, quando gamam algum petisco sem autorização, como fazem muitas vezes ao isco que os pescadores têm por perto para sua utilização … e voam … voam … voam … e se é sobre terra são sinal de vendaval ou temporal no mar … Essas são as melhores companheiras do coleccionador, pois lhe indicam onde existem conchas. Normalmente, aí estão elas na areia a debicar bivalves para comer, quando não há algum   “ pilado “ ou peixinhos de escama que possam agarrar na rebentação. O pilado é um tipo de caranguejo mole de cor castanha com pás em vez de patas ( tipo tartaruga ), que quando na desova vêm junto à praia aos milhares e são atiradas para a areia pela ondas em desmaio. A presença das gaivotas sobre a areia, como ficou dito, é um óptimo indício de boa recolha de conchas .
Chego a andar mais de duas horas de cada vez que me disponho à recolha de conchas, o que significa muitos quilómetros andados sobre a areia e muitas centenas de conchas apanhadas .
Acabo por me sentir o que se chamaria um verdadeiro “ catador de conchas “ … e … antes conchas que outras coisas funestas, que infelizmente abundam nas nossas praias. Para isso existem os grupos de limpeza camarária …
Por muito treino que tenha, por vezes lá parece uma concha que não sei a que família pertence e torna-se essa no alvo primordial da minha atenção. Quando chego a minha casa, lá me vou entreter com ela, até achar a sua descrição e correcta identificação. É uma alegria quando o consigo com perfeita convicção, mas há dias … e não são poucos, que folheio livros … e livros … e livros … e busco no meu banco de dados e … não encontro a concha … para a poder classificar correctamente … e lá fica ela sobre a minha secretária à espera de melhor disposição da minha parte para a investigação ou que venha numa situação muito comum um dos meus gatos e me obrigue a andar de cócoras à procura dela em tudo quanto é sítio … e aí está como se faz ginástica na praia e em casa quando se anda em busca das Conchas perdidas pelo mar .

Lisboa, 2006

Publicado nesse mesmo ano na revista de Malacologia " O BÚZIO "

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